Com a autorização da revista internacional de improviso Status, Luana Proença e Davi Salazar traduzem e gravam em português o conteúdo mensal da revista.
SIM, existe uma revista mensal sobre Impro que questiona e valoriza o que fazemos, E seu conteúdo é disponibilizado em português AQUI por escrito, e em áudio em nosso PODCAST no Spotify: Revista Status - PT.
A revista STATUS é publicada mensalmente e virtualmente em espanhol, inglês, italiano e francês. Informações e assinaturas: https://www.statusrevista.com/.
****************************************************************
QUANDO VOCÊ PAROU DE IMPROVISAR?
por Feña Ortalli
Quando você parou de improvisar? Não estou perguntando se você abandonou a improvisação. Não. Estou perguntando se você ainda está improvisando ou se simplesmente foi vítima da repetição, da falta de risco e da previsibilidade. É muito fácil sentir tédio quando nos tornamos "especialistas" em alguma coisa. O risco diminui e nós relaxamos. A pior coisa que pode acontecer a nós, pessoas improvisadoras, é nos sentirmos demais em segurança. Pessoalmente, busco o risco de duas maneiras. Por um lado, uso discursos opacos e vagamente definidos. Evito deliberadamente a possibilidade de definir uma plataforma sólida e concreta. Por outro lado, tento correr riscos com a encenação e a direção, buscando diferentes recursos formais para cada proposta, sejam eles físicos, espaciais, emocionais, textuais ou narrativos. Depois de mais de 20 anos dedicados a isso, sei como fazer uma cena improvisada com confiança. Mas não viemos aqui para ficarmos em segurança. Viemos para improvisar. Geralmente associamos o estresse a uma reação do nosso sistema nervoso a uma situação ameaçadora. Essa reação é causada pelo cortisol, um hormônio responsável por nos manter alertas. Os níveis de cortisol caem quando vamos dormir e sobem novamente quando acordamos. Entretanto, quando sentimos medo ou ficamos num estado assustado, nosso corpo produz mais cortisol do que o necessário para lidar com uma ameaça em potencial. O excesso de cortisol pode causar insônia, fadiga e até mesmo depressão e ansiedade. Em 1974, o Dr. Hans Selye dividiu o estresse em dois tipos: o ruim (distress) e o bom (eustress). A principal diferença entre os dois está na percepção do nosso cérebro de que esse estresse é voluntário ou não. O estresse involuntário causado por uma ameaça é ruim, mas o estresse voluntário, como embarcar em um novo projeto, sair para um primeiro encontro ou subir ao palco sem um roteiro, é bom. Portanto, mantenha seus níveis de cortisol altos assumindo riscos toda vez que subir ao palco para improvisar e aproveitar o eustress.
****************************************************************
ANDRÉ ANTOINE
por Feña Ortalli
André Antoine (31 de janeiro de 1858 - 19 de outubro de 1943) foi um ator, gestor teatral, crítico, diretor de cinema e pioneiro do drama naturalista que fundou o Théâtre-Libre em Paris. Antoine estava trabalhando como funcionário da Paris Gas Company e trabalhava no Archer Theatre quando pediu para produzir uma dramatização de um romance de Émile Zola. O grupo amador recusou o pedido, então ele decidiu criar seu próprio teatro para concretizar sua visão do desenvolvimento adequado da arte dramática. Em 1887, ele fundou o Théâtre-Libre como uma vitrine para o trabalho de dramaturgistas naturalistas da contemporaneidade. Embora o Théâtre-Libre tenha fracassado financeiramente, produziu mais de 100 peças, de cerca de 50 dramaturgistas, e estabeleceu um modelo de teatro realista que teve profunda influência sobre os teatros independentes de toda a Europa. Em 1896, ele foi forçado a fechar o teatro, mas um ano depois, após atuar brevemente como codiretor do Théâtre de l'Odéon, fundou o Théâtre-Antoine, oferecendo produções semelhantes às de sua companhia original. Antoine se opôs aos ensinamentos tradicionais do Conservatório de Paris e se concentrou em um estilo mais naturalista de atuação e encenação. Ele acreditava que o ambiente moldava o caráter e o comportamento, e procurou criar cenários que refletissem fielmente todos os aspectos da vida real. Muitas vezes, ele contratava apenas artistas sem treinamento, pois acreditava que as pessoas atrizes profissionais de sua época não conseguiam retratar pessoas reais de forma realista. Ele também acreditava literalmente na noção de remover a quarta parede. Em algumas peças, ele ensaiava no espaço com quatro paredes ao redor da ação, do cenário natural e do elenco, e depois decidia qual quarta parede remover e, assim, decidia de que lado ou perspectiva colocar o público. Em 1906, foi nomeado diretor exclusivo do Odéon. Depois de oito anos, pediu demissão para se tornar crítico de teatro e um diretor de cinema extremamente inovador (1914-24). FONTES: https://en.wikipedia.org/wiki/Andre_Antoine https://www.britannica.com/biography/Andre-Antoine https://www.britannica.com/topic/Theatre-Libre
****************************************************************
MATÍAS AVACA
por Feña Ortalli
Essa é uma boa pergunta que me faz refletir. Sempre gostei da ideia de viajar e conhecer o mundo, apesar de não ter tido muita chance de explorar essa possibilidade até os meus vinte anos. Foi quando descobri o conceito de "visto de trabalho de férias", um tipo de visto que permite que você viaje e trabalhe em outros países. Fiz um nos EUA, uma temporada de inverno em uma estação de esqui, e com o que economizei, viajei pela Europa por três meses. Quando voltei para a Argentina depois dessa viagem, gostei da ideia de continuar nesse caminho e, quando terminei meus estudos, optei por vir para a Nova Zelândia. Naquela época, não havia muitas opções para quem tinha passaporte argentino.
Cheguei à Nova Zelândia em 2016 e me estabeleci aqui depois de encontrar um emprego que me permitiu ficar e, eventualmente, solicitar a residência permanente. Se tudo correr bem, em breve poderei solicitar a cidadania, o que me permitirá ter dupla cidadania (argentina e neozelandesa).
E a impro veio comigo, ela me acompanha aonde quer que eu vá. Foi uma das coisas de que mais senti falta quando me mudei da Argentina para a Nova Zelândia, então não demorou muito para que eu começasse a fazer impro, primeiro em espanhol e depois também em inglês.
Como foi esse primeiro contato com a comunidade de impro na Nova Zelândia?
Bem, inicialmente começou com uma pesquisa nas mídias sociais, procurando por grupos de teatro ou impro em espanhol em Auckland, a cidade onde moro. Não consegui encontrar muita coisa, mas uma das pessoas que entrou em contato comigo foi Nico Mankiewitz, um argentino que morava na Nova Zelândia há alguns anos e recentemente começou a fazer impro em inglês. Nós nos encontramos para almoçar e começamos a planejar um workshop aberto de impro em espanhol, para pessoas com ou sem experiência.
Não tínhamos nada a perder! E foi um sucesso total. Cerca de dez pessoas participaram, empolgadas com a oportunidade de fazer teatro em espanhol. Quando vimos que havia interesse, lançamos um curso introdutório de impro que repetimos várias vezes por ano.
Rapidamente, tivemos vários grupos simultaneamente, apresentações ou espetáculos quase todos os meses, e tivemos até a visita de Omar Galván, que veio a Auckland depois de participar do festival de Canberra em 2017.
Foi assim que a Mabel nasceu?
É isso mesmo. Quando chegou a hora de planejar a primeira apresentação do grupo, achamos que seria uma boa ideia encontrar um nome que representasse o grupo que havia sido formado. Inicialmente, o projeto que Nico e eu concebemos se chamava "Impro Teatro Nueva Zelanda", mas não era algo que representasse o elenco que se formou com as primeiras turmas dos cursos introdutórios. Então, em conjunto, acabamos escolhendo o nome "Mabel" ou "Mabel Impro" para promover os espetáculos.
Toda vez que lançamos um curso introdutório, gera-se uma energia e um ímpeto maravilhosos. Acho que, com o tempo, percebi como pode ser exigente criar e coordenar esses espaços, especialmente quando se trata de grupos de falantes de espanhol. Todas as semanas, chegamos com muita energia para compartilhar, com ansiedade para nos divertir, socializar, passar bons momentos, e é importante perceber que, para que esse espaço exista, há muito trabalho por trás dele. E esse trabalho pode ser muito exigente e exaustivo. Porque, para nós, não se trata apenas de um workshop e pronto, cada pessoa vai para casa... Trabalhamos com o conceito de comunidade, um senso de pertencimento, refúgio, companheirismo. E isso vai além das duas horas de duração de cada workshop semanal.
Por que Mabel?
Pelo que me lembro, naqueles primeiros grupos, o nome "Mabel" era frequentemente usado para nomear personagens em cenas. No início, era uma coincidência, mas depois se tornou uma piada interna. Então, quando chegou a hora de encontrar um nome para o grupo, com a premissa de usar algo curto e fácil de lembrar, Mabel ficou.
Mas minha memória pode estar falha, porque também me lembro de que se falou em fazer um pacto entre os membros originais, de que toda vez que alguém perguntasse "por que Mabel?", teríamos que dar uma nova resposta que não tivesse sido dita antes para manter o mistério da origem do nome.
Como você descobriu a impro?
Outra boa pergunta que me leva a uma viagem no tempo. Sem perceber, descobri a impro por meio do programa "Whose Line Is It Anyway?". O programa era exibido no canal Sony, se bem me lembro, nas manhãs de sábado, e eu costumava assisti-lo com meu pai quando conseguíamos ligar a TV a tempo. Isso foi na minha adolescência. Depois, aos vinte e poucos anos, descobri outro lado da impro por meio da Liga Mendocina de Improvisación, que, domingo após domingo, lotava (e continua lotando) os maiores teatros de Mendoza com seu espetáculo. Pouco depois de descobri-la, tive a chance de participar das oficinas de treinamento da Liga que Esteban Agnello, juntamente com Sebastián Luna, ofereciam e, por fim, pude dividir o palco com eles. Foram anos mágicos!
Que diferenças você encontrou entre a impro em Mendoza e impro em Auckland?
Há muitas diferenças entre a impro em Mendoza e em Auckland, mas não tenho certeza se elas são específicas de Mendoza e Auckland, em particular. Acho que isso está mais relacionado à identidade que a impro adota em diferentes partes do mundo.
Em minha opinião, em Mendoza, e em outras partes da América Latina e da Europa, a impro é uma das disciplinas dentro do conceito de teatro ou artes cênicas. Por exemplo, continuando com a resposta anterior, muitas das pessoas improvisadoras da Liga eram alunas ou graduadas do programa de ensino de teatro. Há um talento multidisciplinar que faz uma diferença incrível na apresentação de um espetáculo. Acho que no mundo anglo-saxão, a impro vem mais do lado da comédia e do stand-up. Obviamente, há exceções, e essa não é uma regra que se aplica a todos os casos, mas é o que vejo com frequência nessas partes do mundo. Isso faz com que a impro aqui seja muito mais verbal e rápida com as palavras, e talvez menos física e gestual.
O que você aprecia nos diferentes estilos que conhece? Qual seria a impro "ideal" para você?
Essa é uma pergunta que não tem uma resposta simples, na minha opinião. Acho que todos nós deveríamos nos fazer essa pergunta de vez em quando, pois ela convida à reflexão e à análise. A resposta a essa pergunta deve ser dinâmica, viva e mutável.
Em meus primeiros dias explorando os caminhos da impro, o Match era basicamente a única coisa que me cercava, como público e como artista. E a verdade é que passei a apreciá-lo muito. O impacto e a eficácia que ele tem sobre o público são impressionantes, é simples de "vender" e você não precisa de muito contexto técnico para entendê-lo e apreciá-lo. Depois descobri o formato longo e o formato longo narrativo e, a possibilidade de contar histórias, encontrei um habitat tão misterioso quanto fértil.
Atualmente, a impro ideal ou a que mais me agrada é aquela que nos permite sentir, reformular opiniões e crenças, viajar no tempo e no espaço e jogar como se nada mais importasse fora desse lugar. Acho que os espetáculos que incorporam o aspecto narrativo da impro são os que geralmente me transportam com mais eficácia para esse lugar.
Como pessoas improvisadoras, estamos sempre incorporando novas ferramentas, conceitos e ideias. Qual foi a última coisa que você acrescentou ao seu kit de ferramentas de impro?
Gosto muito de dedicar tempo para pensar em como será a experiência do público nos espetáculos que apresento no palco. Acredito que nada deve ser deixado ao acaso. O fato de fazermos um espetáculo de impro não significa que seja uma produção improvisada. Acho que a experiência do público, desde o momento em que ele entra no teatro até o momento em que sai, deve ser usada para tentar transmitir a mensagem que queremos que ele leve consigo.
Nessa cruzada, nos últimos anos, tenho prestado mais atenção a diferentes aspectos que dão suporte a quem improvisa no palco. Por exemplo, incorporei o uso de projeções em espetáculos como “Carousel”, “Perfectos Desconocidos” e “Hotel Sol”. Por outro lado, em espetáculos como “La Catrina”, usamos acessórios ou figurinos específicos para dar suporte visual à narrativa, acrescentando outra camada de profundidade. E também, sempre que as possibilidades permitem, tento ter musicistas ao vivo que ajudam a ampliar a mensagem que queremos transmitir.
Já que você fala sobre mensagens a serem transmitidas, por que você improvisa? Que mensagens você gosta de transmitir quando entra no palco?
Gosto de dar voz a histórias que nem sempre temos a oportunidade de ouvir. E isso é algo que sinto que foi reforçado quando me mudei para a Nova Zelândia. Aqui, encontrei muitos irmãos e irmãs de língua espanhola que não tinham um lugar ou espaço para contar suas histórias. Depois de todos esses anos de trabalho e esforço, canalizados principalmente pelo grupo Laenye, com quem concebemos produções como “La Catrina” e “Mi Casa, Su Casa”, podemos dizer que esse espaço e essa comunidade agora existem e têm voz.
Sinto uma certa responsabilidade, improvisando deste lado do mundo, de contar histórias que representem nossa comunidade. E, nessa representação, é importante tentar nos afastar dos estereótipos e das versões caricaturais de quem somos e, em vez disso, honrar nossa identidade e diversidade cultural.
E como docente, o que você mais gosta de ensinar?
Durante meus primeiros anos como instrutor e convidado em festivais na Nova Zelândia e na Austrália, meu foco era a impro como uma linguagem universal, apoiada por ferramentas e técnicas para aproveitar o fator multilíngue de um elenco ou grupo de impro. A partir desse trabalho, surgiram produções como “Living La Impro Loca” e “Comedy World League”, que abriram portas para mim tanto em Auckland quanto no resto da região.
Depois, meu foco mudou para o gênero do Realismo Mágico e, a partir daí, a maioria das produções em que trabalhei tinha esse gênero como elemento comum. Espetáculos como “The Bench”, “Carousel” e, mais recentemente, “La Catrina”, se baseiam muito nos recursos e nas características que o Realismo Mágico oferece para contar histórias. Até hoje, ainda gosto de explorar o realismo mágico, incorporando o conceito de "encontrar a cena a partir do caos", preferido por grandes elencos.
Também gosto de fazer coaching e workshops sobre trabalho de cena. Tive a sorte de aprender com grandes nomes da impro que são referências nessa disciplina, como Omar Galván, David Razowsky, Joe Bill, Patti Stiles e Jonathan Briden, para citar alguns. Aquele momento em que as pessoas improvisadoras com quem trabalho "encontram a cena" e se permitem tocar e se divertir é muito gratificante.
Se você tivesse recursos ilimitados, como seria a sua produção ideal? Pontos de bônus se você me disser o elenco.
Acho que conversamos um pouco sobre isso em Canberra. Sinceramente, tive muita sorte de poder viajar e conhecer muitas pessoas talentosas em todo o mundo. Eu gostaria de tê-las todas no mesmo espaço fazendo impro por horas e horas.
O que me faz pensar... Se eu tivesse recursos ilimitados, pagaria os voos e a hospedagem de todas as pessoas improvisadoras do mundo para organizar uma versão de 24 horas da Auckland Improv Marathon, com vários palcos. Teríamos espetáculos como “Our Play”, de Joe Bill e Patti Stiles; “Drum Machine”, de Jill Bernard; qualquer espetáculo do Maydays (o que quiserem fazer); “El Capricho del Rey”, com você e Diego Ingold; “Vampire High School”, “Ghost of Love”, “How I Saved The World Over Summer Vacation”, com o elenco de Sacrebleu 2018; “Solo de Impro”, de Omar Galván; “Impros Mínimas”, com uma mistura de pessoas improvisadoras da América Latina; “Match NZ vs. The World”, com uma combinação de pessoas improvisadoras kiwis contra uma combinação de improvisadoras do resto do mundo; “La Catrina” também, já que estamos falando disso, e muitos outros que, se eu continuasse a lista, seria interminável.
Que projetos você tem para 2024?
2023 foi um ano fabuloso! Finalmente pude participar de festivais e trabalhar com diferentes grupos em todo o mundo, depois de tantos anos em que isso não era possível. Sinto-me muito inspirado e grato e, em 2024, tentarei continuar canalizando essa inspiração para novas produções a serem adicionadas ao meu portfólio. “Hotel Sol” já é uma realidade, depois de sua estreia em Canberra no final de 2023, e tentarei continuar a desenvolvê-lo em Auckland e depois levá-lo a outros festivais da região.
“La Catrina” teve uma estreia auspiciosa este ano e, junto com Laenye, tentaremos levá-la em turnê pela Nova Zelândia e, se possível, também pela Austrália.
É fato que a Auckland Improv Marathon voltará este ano, e já tem data: será no fim de semana de 19 de outubro. Aproveito a oportunidade para estender o convite a todo mundo que quiser se juntar a nós. Por outro lado, este será o primeiro ano em que acompanharei o Auckland Improv Festival na condição de participante e não de diretor, tendo deixado o evento nas mãos de uma equipe que está trabalhando incansavelmente para dar continuidade ao sucesso obtido até agora.
Pretendo organizar mais workshops em Auckland, aproveitando a oportunidade que o Ockham Collective me deu ao me selecionar como um de seus artistas em residência para 2024, proporcionando-me a possibilidade de ter um espaço físico para desenvolver meus projetos artísticos.
Por outro lado, gostaria de me aprofundar na representação de minorias étnicas no impro em Auckland e na região em geral. É um tópico que me preocupa e me entusiasma, e espero poder oferecer apoio, a partir de minha posição, para que todas as vozes que representam a comunidade de impro em Auckland e em outras partes do mundo tenham seu lugar.
Última pergunta, Mati. Quem você acha que deveríamos entrevistar?
Vários nomes me vêm à mente, mas o que mais me chama a atenção no momento é Jim Fishwick. Jim é uma pessoa muito talentosa, originária de Sydney, com uma visão de impro que me representa muito e que eu admiro. Como geradora de formatos, Jim é uma pessoa muito criativa e inovadora. Este ano, ele estreou na codireção do New Zealand Improv Festival, um dos festivais que mais gosto no mundo, e Jim, junto com Matt Powell, conseguiu preservar o espírito do festival criado por Jennifer O'Sullivan.
****************************************************************
SÍNDROME DE IMPOSTORA AO PREPARAR SUA AULA
por Laura Doorneweerd-Perry
Não consigo contar as vezes em que fiquei debruçada sobre meu caderno, tentando criar o exercício perfeito para minha aula daquela noite. Pesquisando on-line, pegando livros, perguntando a colegas: nada disso me ajudou a concluir meu plano de aula. Não é preciso dizer que um novo exercício nunca foi a resposta. A síndrome de impostora ("Quem sou eu para ensinar improv?") é real. E ela pode ocorrer em qualquer momento de sua carreira e em qualquer ponto do processo de ensino. Portanto, vamos falar sobre como combater esse sentimento quando você estiver sentada em frente ao seu caderno (digital) e planejando sua aula. Sentir que não é boa o suficiente para ensinar improv é normal. Muito normal. E muito comum também. Você não está só nessa. E quando isso a atingir durante a preparação da aula, tente mudar seu foco de si ("Que droga, se eu fosse uma pessoa professora melhor/mais experiente/mais confiante") para as pessoas que são suas participantes ("Do que elas precisam hoje?"). E o que elas precisam é de uma pessoa professora que as veja. Alguém cuja atenção esteja voltada para elas, e não para dentro. Portanto, aqui está o que sugiro que você faça:
- Conclua seu plano de aula de forma imperfeita. Que seja chato, repetitivo, sem originalidade ou igual a uma aula anterior.
- Não olhe para o plano novamente. Apenas apareça na sala, talvez um pouco mais cedo. Faça com que seja um espaço agradável para você.
- Faça o que for necessário para se sentir presente. Respire, medite, dance, faça barulhos de pum, o que for melhor para você.
- Quando as pessoas participantes entrarem, esteja presente com elas. Veja como está a linguagem corporal delas, faça contato visual e/ou pergunte como estão se saindo.
- Permita-se saber onde suas participantes estão hoje. Talvez você faça uma rodada de check-in, talvez você as observe fazendo um aquecimento.
- Em seguida, pegue seu plano de aula "imperfeito" e adapte-o ligeiramente com base em como as participantes estão se sentindo ou se comportando. Por exemplo:
- Muita energia? Deixe que elas façam um exercício várias vezes, sem análise. Apenas fazendo, fazendo, fazendo.
- Descontraídas? Deixe que elas façam um exercício, mas também dê bastante tempo para que elas se encontrem e conversem.
- Inseguras? Deixe que elas façam os exercícios por mais tempo e só faça um resumo do que está indo bem.
- Revigoradas e comprometidas? Deixe que eles deem sugestões de como os exercícios podem ser adaptados e experimente-os.
- Aceite que tudo o que acontece em sala de aula também é seu aprendizado. Algumas coisas funcionam, outras não. E isso não tem problema.
****************************************************************
BUFANDA ROJA
por "kiti" Ferrero Seção coordenada por Luana Proença (luanamproenca@gmail.com)
Algumas das práticas pedagógicas comuns na América Latina que sempre me inspiraram em Teatro são as chamadas Desmontagens Cênicas ou os estudos da Genética Teatral. Uma abertura dos processos de criações onde eles são “desfeitos” parte a parte para que possamos ver como se deu a junção daquela obra. Assim, todos os meses eu vou dar espaço para grupos e artistas abrirem suas criações para uma partilha inspiradora. Se você quiser partilhar sobre o seu processo, entre em contato comigo, Luana Proença.
Sei que apresentar um espetáculo solo em formato longo (e curto) pode ser assustador, assim como sei que, mesmo sendo uma apresentação solo, você nunca está só. Você tem todos os ombros de gigantes para se apoiar (Isaac Newton), tem suas memórias, referências, livros, filmes, poemas, músicas com as quais você entrou em contato, seu corpo/espaço, seu espaço/arquitetura, sua equipe e o público com todas as suas próprias referências e memórias. E com certeza: sua pesquisa e seu treinamento são os pilares do seu poder. Portanto, é muito bom quando alguém tão diferente de você compartilha uma experiência que também é diferente, mas próxima ao mesmo tempo. Aqui está "kiti" Ferrero e seu espetáculo solo "Bufanda Roja".
1) Título e ano do espetáculo
BUFANDA ROJA (CACHECOL VERMELHO), 2023.
2) Referências técnicas/artísticas
Criação, produção, desempenho: "kiti" Ferrero
Direção: Jazmín Savignac & Emilio Tanus
Montagem do palco e iluminação: Jazmin Savignac, Emilio Tanus e "kiti" Ferrero
3) O que é o espetáculo
Em cada decisão, escolhemos uma dentre milhares de possibilidades, mas em todas essas possibilidades há uma inevitável e onipresente: a Morte.
Formato longo, individual, improvisação narrativa
4) Sobre o processo de criação Acredito que não há um momento inicial onde uma obra começa, são pensamentos, ideias, dores, alegrias, sensações que se busca trabalhar (às vezes curar) por meio da arte. No meu caso, só sei que a partir de agosto de 2017 iniciei um enfrentamento involuntário, mas inevitável, contra a morte. Essa disputa foi religiosa, filosófica, matemática, linguística, etc. Ainda não acabou, mas "Bufanda Roja" surgiu nesse processo. Dois grandes medos me aguardavam: o formato longo e improvisado e estar só no palco. Combati o primeiro medo a partir de minha segurança na narrativa/literária, recursos absorvidos por muitos livros lidos, oficinas de artes cênicas etc. Somado à grande contribuição em nível de palco e teatro da direção de Jaz e Emi.
O segundo medo era mais complexo, mas entendi que não estou só em cena, mas que há muitas pessoas queridas comigo (várias ainda estão aqui, outras não), e "o erro" também estava comigo, sabendo que falhar faz parte do processo e que um trabalho nunca estará terminado, especialmente no mundo da improvisação.
Depois de anos lendo muito, agora, quando pego um livro, estou interessado em ser capaz de entender: Quem é a voz narradora? Para quem você conta a história?
Se eu puder responder a essas perguntas, tenho certeza de que o caminho para a apresentação do espetáculo estava concluído. Melhorá-lo, obviamente, nunca termina.
Há muito tempo renunciei à filosofia tóxica enraizada na improvisação, na qual temos que demonstrar que estamos improvisando o tempo todo.
Esse espetáculo improvisado tem estruturas, estudos, conceitos, etc.
Não tenho a pretensão de que todo o público entenda ou goste, pois esse espetáculo esconde muitas camadas, que nem todo mundo conseguirá atravessar até chegar ao cerne da questão: uma Bufanda Roja (um Cachecol Vermelho).
Por que se chama “Bufanda Roja”? - Me perguntaram.
A resposta está aí, na própria vida.
5) A estrutura do Espetáculo (o formato)
O espetáculo tem um formato longo de improvisação narrativa.
A sua estrutura é dividida em três partes:
1. Entrada e discurso da entidade:
Uma entidade, a usuária do cachecol vermelho, começa com um discurso pseudoimprovisado
2. A própria improvisação:
Trabalho em um palco com 5 paredes, as três clássicas, a famosa quarta parede (a do público) e uma quinta parede que separa o espaço da narração, que é onde a história é contada por meio de recursos narrativos e a parte da cena onde aparecem as personagens dessa história, cujas cenas contêm recursos dramatúrgicos/literários.
A transição entre um espaço e outro acontece várias vezes. Onde o tempo é marcado com dois relógios que funcionam como relógios de xadrez (apenas um funciona de cada vez), e o tempo corre onde a cena está sendo vivenciada. 3. Encerramento do espetáculo: a entidade retorna e cumpre sua promessa.
****************************************************************
IMPRO PEDAGOGIA
por Por Pamela Iturra (impro.lectora@gmail.com)
Os manuais de impro geralmente são compilações de jogos agrupados por categorias: aquecimento, plataforma, narrativa, personagens etc. Há também manuais em que uma autoria expõe e reflete sobre um conceito relevante da técnica e, em seguida, explica uma série de exercícios ou jogos para aplicá-lo. A maneira como o conteúdo desses manuais é colocado em prática fica a critério de quem lê, e cabe a essa pessoa criar uma aula, um workshop ou um curso organizando essas ferramentas. Nesse contexto, o que diferencia o “Manual de Clases de Improisación Teatral”, de Pau Farias, é que, além de incluir inúmeros conceitos, exercícios e jogos para o ensino, ele apresenta uma proposta didática estruturada. Ele oferece um plano organizado de 12 aulas de improvisação teatral para iniciantes, que podem ser ministradas on-line e/ou presencialmente, com uma progressão cronológica e coerência didática.
O livro pode ser dividido em três partes principais. Na primeira parte, com foco nos conceitos de impro, Pau sintetiza o conhecimento essencial para quem está começando na técnica. A segunda parte se dirige a docentes, compartilhando reflexões e orientações baseadas em sua experiência. Por fim, a autora fornece planos de aula com exercícios, jogos, objetivos, sugestões, variações, ilustrações, gráficos e links para vídeos demonstrativos. Este texto serve como um guia abrangente e um recurso valioso para docentes de impro.
Na seção inicial do manual, a autora define a improvisação como um gênero teatral, uma técnica de criatividade, uma facilitadora do trabalho em equipe, uma aprimoradora da comunicação e um modo de vida. Ela explica brevemente os princípios fundamentais da improvisação: confiança, aceitação, escuta, aceitação de surpresas, adição de propostas, adaptação, presença e outros conceitos mais específicos, como o motor, a plataforma, o status, os gatilhos, os gêneros, as estruturas e as personagens. Esta seção é essencial tanto para docentes de improvisação iniciantes quanto para pessoas improvisadoras, oferecendo uma visão nova, simplificada e sintética dos fundamentos da improvisação. Pau também compartilha sua perspectiva pessoal, incluindo capítulos sobre os benefícios da improvisação e os inimigos da criatividade, transmitindo sua paixão e fornecendo insights sobre como manter o prazer ao improvisar e aplicar as lições aprendidas na vida cotidiana.
Na segunda parte, Pau Farias se dirige às pessoas docentes, compartilhando sua visão sobre como apoiar "artistas em progresso". Ela apresenta sua técnica dos "3 M": manter, melhorar, modificar, enfatizando a importância de criar confiança em iniciantes, destacando suas ações positivas, estimulando a curiosidade e o espírito experimental e orientando as pessoas estudantes na reflexão para identificar áreas de melhoria. Pau também oferece conselhos sobre a estruturação de aulas, incluindo ferramentas técnicas para aulas on-line e metodologias para projetar e estruturar sequências didáticas. O aspecto mais interessante dessa parte é a visão ética e filosófica da autora sobre como ser uma boa professora de impro, promovendo a comunicação genuína, a sabedoria humilde e a flexibilidade no ensino.
Por fim, a autora apresenta um conjunto de 12 aulas de impro com estruturas interconectadas. Cada aula começa com a preparação mental, física e vocal, enfatizando a importância de estar presente para liberar a criatividade. Cada aula inclui vários exercícios de treinamento com objetivos específicos, descritos em detalhes com variações de nível de dificuldade para as pessoas docentes experimentarem. As explicações do treinamento são acompanhadas de fotografias, ilustrações, gráficos e links para vídeos com exemplos e demonstrações (@soypaufa). As aulas terminam com estudantes mostrando o que aprenderam, considerado o clímax, com Pau fornecendo orientação para docentes acompanharem as turmas. No final de cada aula, a autora incentiva a autoavaliação e destaca os aprendizados mais relevantes.
Leia-o se:
Você está começando a ensinar impro ou a trabalhar com um grupo de iniciantes.
Você precisa atualizar suas habilidades de impro e revisar os fundamentos.
Seu principal valor:
A entrega de uma proposta didática bem fundamentada, elaborada e completa. Minha parte favorita: A "enumeratio". Adoro listas, e Pau fornece muitas, como "inimigos da criatividade: dizer não, dúvida, perguntas, falta de escuta, uma ideia melhor, mas, argumento, não sei, pensar demais, destruição". Minha citação favorita: "Precisamos desconstruir esse papel solene da docência. Acho ultrapassada a ideia de uma pessoa docente como alguém que faz tudo perfeitamente, sabe tudo, voando pelos céus enquanto a discípula ou aluna está rastejando no chão, implorando por amor... Pelo contrário, gosto de me educar e aprender com os seres humanos. Eles sabem, têm experiência, mas têm uma vida, cometem erros, riem, mostram suas vulnerabilidades. Não gosto de robôs, superdocentes ou símbolos educacionais que são inatingíveis e aos quais nunca poderei aspirar. Hoje em dia, aprendemos muito mais com a experiência do que com a sabedoria. Está em nossas mãos e é nossa responsabilidade humanizar o ensino, então vamos em frente!"
Comentários
Postar um comentário